Corpos, territórios e feminismos busca reconhecer o protagonismo daquelas que sempre lutaram pela vida. Dividido em três partes, começa apresentando perspectivas político-teóricas para a compreensão das lutas populares de Abya Yala, com destaque para a ideia de (re)patriarcalização dos territórios, um processo desencadeado por projetos neoextrativistas que reconfigura, nos territórios, uma nova ordem patriarcal, aprofundando e reatualizando relações machistas preexistentes. Outro conceito que figura nessa seção é a geopolítica do útero, desenvolvida a partir da resistência das mulheres Épera, que fazem da reprodução uma trincheira contra a morte lenta e coletiva de seu povo.
Na segunda parte, Corpos, territórios e feminismos expõe propostas e aplicações metodológicas para o trabalho de politização em coletivos de mulheres. São narradas, entre outras, as experiências do Teatro das Oprimidas praticado pelo coletivo Magdalenas, no Uruguai, por meio do qual as militantes foram se descobrindo alvo de uma série de violências; e o trabalho do Colectivo de Geografía Crítica de Ecuador, que mapeou feminicídios com base em notícias veiculadas na imprensa do país.
Por fim, a terceira parte do livro oferece cinco diálogos para discutir conceitos e realidades da luta das mulheres em defesa dos territórios na América Latina. Um dos textos coloca em xeque o conceito de Pacha Mama, largamente adotado por movimentos sociais, ecologistas e indígenas, questionando o motivo que levou — e continua levando — à atribuição de um «gênero» à terra e à natureza. Outro ponto de debate é o “patriarcado ancestral”, ou seja, a existência, entre os povos indígenas, de uma cultura machista anterior à colonização, com valores que não eram iguais aos impostos pelos europeus, mas que, ainda assim, e de formas totalmente outras, oprimiam as mulheres.
Com um pé na academia e outro na militância, Corpos, territórios e feminismos pretende nomear as sujeitas invisibilizadas pela história imposta pelos vencedores — quase todos homens, heterossexuais, brancos, ocidentais e burgueses. Para povos originários, comunidades subalternas e coletivos periféricos, a defesa do território sempre existiu — é um processo de vida em devir e com memória ancestral. A visibilidade que essas lutas alcançaram atualmente é uma resposta à violência sanguinária do sistema capitalista, patriarcal e colonial, que direciona seu ódio às formas de vida que incomodam, às maneiras disruptivas de ser e pensar, que destoam do arranjo da ordem estabelecida e que dizem basta!