Aqui o leitor se depara com uma bela e comovente investigação, uma reflexão da instância ética no processo estético, uma experiência fundamental e exemplar para estudantes, professores, pedagogos em Artes da Cena e, inclusive, leigos. Nesta leitura, somos levados à fase inicial do teatro de Bob Wilson, quando o artista elabora as bases de seu trabalho, guiado pela escuta e pelo olhar em dois meninos: Christopher Knowles, autista, e Raymond Andrews, surdo. Lucas Pinheiro nos conduz por um relato envolvente da trajetória de dois jovens deficientes, reconhecidos como colaboradores de um artista que os valoriza como criadores e performadores, sem nenhum paternalismo. Ao relacionar o interesse do artista com alguns traços de sua biografia, o autor aponta nas deficiências de Wilson — ele mesmo portador de uma gagueira acentuada — seu interesse pelos dois jovens. Aos dezessete anos, Wilson conhece Byrd Hoffman, uma professora de balé de sua cidade natal. Ela o auxilia na superação de suas disfunções com exercícios de relaxamento e de extensão de tempo para realizar o ato da fala e determinadas ações físicas. A experiência marcou sua vida e sua arte. Fortemente influenciado pelas artes visuais e pela dança, Wilson integra os processos criativos de Knowles e de Andrews em suas primeiras obras, num encontro radical com a alteridade e com a diferença. Bob Wilson: por trás do olhar de um surdo e da voz-pensamento de um autista é, também, uma narrativa desse interesse de Wilson por outras áreas da criação e reflete sobre os múltiplos sentidos de sua poética na fase inicial. Leitura imperdível.
Isa Etel Kopelman