Marcelo Rubens Paiva

As primeiras lembranças que guardamos para o resto da vida são as de quando temos três ou quatro anos, e a cada ano que passa virão mais lembranças que serão guardadas, cinco, seis, sete, que se tornam as primeiras lembranças mais fortes do que o esquecimento, que serão cobertas por novas experiências, que se acumulam, se acumulam, se acumulam, oito, nove, dez…

O renascimento de um fato psicológico passado, seu reconhecimento e localização são as condições necessárias das lembranças.
Ou da memória.

Fazia sol, mas me lembro do cheiro de que ia chover.
Talvez todo paulistano detecte com precisão o cheiro da chuva a caminho.
Sente no ar que o mundo pode desabar e tudo vai mudar.
Sabe que, se chove, segue-se o caos.

memória é uma mágica não desvendada.
Um truque da vida.
Uma memória não se acumula sobre outra, mas ao lado.
A memória recente não é resgatada antes da milésima.
Elas se embaralham.

– O que estou fazendo aqui?

Ou melhor:

– O que é mesmo que vim fazer aqui?

E talvez:

– Onde é aqui?

Uma das poucas especialistas em direito indígena, foi advogada da fundação do Gilberto Gil, foi advogada no Brasil do Sting, que doava grana para os caiapós, ele ligava para ela em casa, com um sotaque inglês inconfundível:

Para onde foi todo esse conhecimento?

Como Major Tom, o astronauta de David Bowie que empacou flutuando no espaço num jeito peculiar, ao redor da Terra.