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Marcio Goldman

  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    Em que pesem as evidentes divergências e variações de abordagem, os pontos de vista guiados por tal perspectiva, como bem apontou Goldman (2017a, p. 15), “parecem ter em comum o fato de adotarem uma concepção da diversidade que supõe que o destino inelutável de qualquer agenciamento entre diferenças seja a homogeneidade, quer essa se manifeste por depuração e purificação, quer por mistura e fusão”.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    afirma Goldman acerca da noção de contramestiçagem: “Contra, aqui, deve certamente ser compreendido no sentido clastriano de uma recusa ativa do Um e de uma afirmação das multiplicidades. (…) a questão que se coloca é quais seriam e como funcionam as máquinas de guerra afroindígenas mobilizadas para conjurar a mestiçagem e o sincretismo enquanto figuras da unificação estatal?” (2017a, p. 25). Como se vê, a contracolonização concebe as reações às violências de atualização colonial, mas compreende também uma afirmação dos modos de vida que estabelecem relações outras com a natureza, o território, outros povos, as coletividades, tal como praticados pelos povos originários das Américas e aqueles violentamente trazidos da África.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    Cada um desses modos de relação implica diferentes dinâmicas de saber. O saber sintético, atinente a um modo colonizador, é atravessado pela cosmofobia, o medo do cosmo, com uma consequente desconexão com o mundo, uma experiência de fragmentação e isolamento que, via de regra, busca estabelecer relações de propriedade com o conhecimento, a natureza, o território, o trabalho.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    Por outro lado, creio que essas oposições servem a uma elaboração mais ampla. Traçar essas linhas faz parte de um movimento anterior e necessário, que envolve a recusa de regimes violentos e indesejados de relação, no mesmo passo em que afirma outros modos de existência. Essa recusa, elaborada como oposição, cria espaço para conceber relações que partam das possibilidades de encontro como forças, não como ameaças. Quer dizer, utilizando uma imagem de Bispo dos Santos (2019a), trata-se justamente de perceber onde estão as fronteiras, possibilidades de diálogo e conexões, e onde estão os limites impostos, aqueles onde o diálogo não tem espaço e a relação não é possível em chave diferente da violência, da subjugação e do horizonte de obliteração. A partir daí, uma abertura para a experimentação de modos de conexão em outras bases torna-se viável, em um campo onde é possível compor relações em um horizonte de potencialização de forças e de afirmação das multiplicidades.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    o saber orgânico, voltado para o ser, para as experiências de existência em conexão, em linha de continuidade com os outros seres que compõem o mundo, incluindo aí ancestrais e descendentes. A horizontalidade e a circularidade que o atravessam escapam às pretensões universalistas e estão sempre referidas aos territórios existenciais que constituem as comunidades de onde emanam esses saberes: quilombolas, indígenas, povo de terreiro. Longe de experiências isoladas, podem ser entendidas como territorializadas, pois é a partir desses territórios que se abrem para as conexões.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    Evidentemente essas experimentações e encontros não estão livres de riscos. E talvez o risco mesmo de qualquer encontro seja justamente virar Um, de forma que são necessários uma série de procedimentos e cuidados para evitar que o encontro se traduza em fusão, substituição ou obliteração. A partir daí, trata-se de cuidar para que se mantenha o que se propõe: um encontro, que concebe as “especificidades e particularidades” em contato e parte das experimentações e modulações criativamente vividas.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    É preciso transfluir, romper, atravessar fronteiras – espaço-temporais, sociopolíticas, históricas – para poder confluir. Em outros termos, as confluências não estão dadas, não são garantidas: elas dependem de movimentos de transfluência.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    Essa perspectiva ressoa aquilo que José Carlos dos Anjos (2008) chama de filosofia da diferença das religiosidades afro-brasileiras e está ligada a um modo próprio de relacionar-se daqueles que percebem “as suas deusas e deuses através dos elementos da natureza como, por exemplo, a água, a terra, o fogo e o ar e outros elementos que formam o universo” (Bispo dos Santos, 2019a, p. 30).
  • John Lorezfez uma citaçãohá 14 dias
    A fábula de Descartes no Brasil tem outro sentido. Aquele a quem se atribui a invenção da lógica analítica, do racionalismo triunfante, da nossa modernidade mental e tecnológica, se dá conta a duras penas da violência a ser necessariamente exercida para que uma realidade outra se acomode aos moldes preestabelecidos da razão ocidental.
  • John Lorezfez uma citaçãohá 17 dias
    Tais movimentos, parece necessário ressaltar, não implicam em uma homogeneização e uma laminação das diferenças ou no estabelecimento de identidades fixas. Fosse o caso, recairíamos na mesma tentação de pensá-los em termos de alguma “conexão entre coisas iguais”, e as diferenças apareceriam como meros detalhes. A questão parece ser mais sobre o próprio modo de conexão, sem a pressuposição de que uma parte se imponha às demais e que faça da indeterminação, da diferença e da própria tensão da fronteira, uma força. Assim, os encontros, transfluentes ou confluentes, dão-se nas fronteiras; nem se chocam como limites, nem pretendem convergir para um centro único. Evidentemente é nesse ponto que também residem os atritos, conflitos e guerras (que, ainda assim, podem ser pensados em termos contra-hegemônicos, sem a pretensão última da fusão), mas também é essa condição que oferece a possibilidade de forjar alianças concebendo singularidades. Demanda, portanto, manutenção e cuidado. É esse território incerto e instável, a passagem entre o que se sabe e o que é desconhecido, o que viabiliza a possibilidade de um encontro potencializador. O encontro, então, diz mais respeito a experiências de aliança e de ressonância do que a um evento total e enrijecido, fixo no tempo; trata-se de algo que extrai força da própria tensão das fronteiras e está sempre acontecendo.
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